A filosofia Lean tem se espalhado cada vez mais no mundo dos negócios. Está no chão de fábrica, nas áreas administrativas e de serviços, e até em hospitais. Mas como é a difusão da metodologia Lean no setor público? Existem projetos desses ao redor do mundo?
Sim! Presenciei pessoalmente implementações do Lean nos Correios e em gabinetes públicos da França. Ouvi dizer que o Canadá tem tido boas experiências com a metodologia Lean no governo também.
A questão que se mantém é: o que queremos dizer com “Lean”? O trabalho pioneiro de líderes Lean, como Art Byrne ou do meu próprio pai, levou essencialmente a dois caminhos para o Lean: o caminho da “blitz kaizen” (processo de “botar a mão na massa”) e o caminho da transformação do Sensei.
Com a “blitz kaizen”, consultores internos ou externos organizam e facilitam workshops kaizen que resolvem problemas operacionais locais – e depois avançam. O pressuposto é que se alcançarmos uma grande quantidade de melhorias, a organização irá de alguma forma “se transformar”.
Tenho visto de perto tal abordagem nos Correios – e aqui está a questão. Vamos supor que cada kaizen é um sucesso. A mudança é corretamente identificada e planejada. A experiência é feita, cuidadosamente verificada e as conclusões corretas são alcançadas e aplicadas. Se, de alguma forma, estes resultados não forem amplamente compartilhados e a gestão intermediária não alterar suas políticas de governo, não só os resultados locais não conduzirão à transformação, como também, em cada área, é provável que se invertam à medida que as regras organizacionais se reafirmam.
Já com relação às transformações lideradas por um Sensei, o primeiro passo é o CEO encontrar um Sensei com quem possa trabalhar. Isso é, alguém que tenha treinado com um Sensei na linhagem que regressa a Taiichi Ohno. Ao realizar o Go&See no Gemba e ao encorajar o kaizen em todas as áreas, o CEO muda de ideia sobre políticas chave e depois altera as prioridades e procedimentos da empresa, tais como: colocar o cliente em primeiro lugar, cuidar das pessoas, encorajar o trabalho em equipe, construir sistemas de puxada, e assim por diante.
Mas um Sensei é apenas uma pessoa – e existem muitos Gembas para se visitar. Portanto, se a gestão intermediária não estiver envolvida na condução dos seus próprios esforços kaizen, não acontecerá nada.
Para ter sucesso na transformação, ambas estratégias são necessárias. O CEO deve aprender com um Sensei como tornar-se, ele próprio, um Sensei – para trabalhar de forma diferente com os seus próprios executivos, além de como orientar e apoiar e quais as políticas a serem substituídas. E, por fim, tem de haver um amplo programa kaizen para envolver tanto as equipes de trabalho como os gestores intermediários.
No governo, obviamente, o problema é de escala agravada – as instituições públicas são simultaneamente maiores, mais antigas e mais regulamentadas e burocráticas por natureza. Estou confiante que o lean se aplica ao ambiente público, tal como em qualquer outro lugar, mas o desafio da liderança é muito maior.
Michael Ballé
Michael Ballé e autor, palestrante e pesquisador das diversas dimensões da Transformação Lean. É co-autor da trilogia The Lean Strategy e The Gold Mine. É reconhecido mundialmente por treinar CEOs e executivos no gemba. É também Diretor Administrativo da ESG Consultants e co-fundador do Projeto Lean Entreprise e do Lean Institute França. Por mais de uma década, ele se concentrou nas implicações humanas da implementação Lean nas áreas de manufatura, saúde e processos administrativos – e ajudou muitas empresas a executar com sucesso seus programas Lean.
Como é o Lean nos ambientes públicos no Brasil?
Em primeiro lugar eu diria que nós próprios, enquanto clientes, somos utilizadores e clientes de setores públicos, gabinetes públicos. Tipicamente escritórios públicos são conhecidos por terem processos burocráticos. Por quê? Porque eles são muito lentos às respostas que a população necessita.
Para complementar e enfatizar o que o próprio Michael Ballé disse acima, seria muito importante para a liderança do setor público tentar compreender a experiência do cliente, tentar ir e ver no Gemba como as coisas realmente acontecem e funcionam, para que tenham uma compreensão adequada da situação. E então poderemos voltar ao processo interno e identificar o que os impede de responder rapidamente à população. Quais são os obstáculos que os impedem de dar respostas corretas aos seus clientes? Penso que essa seria uma das tarefas da liderança dos gabinetes públicos. Tentar compreender a experiência do cliente porque, de fato, não temos uma boa experiência quando se trata dos serviços públicos. Especificamente no Brasil, sabemos como é difícil conseguir que algo seja feito de forma rápida e correta. Por isso, a minha dica seria que a liderança fosse realmente tentar compreender primeiro a experiência do cliente.
Dário Spinola
Com mais de 20 anos de carreira e forte experiência em consultoria, Dário Spinola ajuda empresas ao redor do mundo a aumentarem sua produtividade e eficiência por meio de robustos projetos de Transformação Lean. Como coach, Dário tem forte atuação junto a executivos de diversos segmentos, com foco em desdobramento de estratégia, abordagem E2E, Shop e Office floor Management e programas de Transformação para cultura de excelência e melhoria contínua.